BARREIRO
Não leva mais que 30 minutos de barco desde a afluente Lisboa até ao Barreiro, uma cidade conhecida pela sua pesada atividade industrial cujos vestígios são ainda visíveis em fábricas abandonadas.
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O rio tranquilo desperta a curiosidade dos poucos turistas que se aventuram até lá – a maior parte dos passageiros na hora de ponta estão de regresso do trabalho, ansiosos por comer e descansar.
No imaginário coletivo Lisboeta, o Barreiro é talvez associado à pobreza e à fealdade. Outrora um centro movimentado, o que resta dos bairros de trabalhadores deteriora-se, aproximando-se de fantasma. Foi num desses bairros que conheci alguém que mais tarde descobri fazer parte de um novo movimento a fermentar para além da costa.
A Hey!Pachuco, uma associação local nascida da loucura do grunge de garagem dos anos 90, está a ser reanimada por um grupo de seis jovens amigos nos seus vintes. Programando regularmente, trazem atos ao Barreiro que não viriam de outra forma, revitalizando a cena cultural e dando aos jovens músicos um espaço para se desenvolverem e se conectarem.
Agora, encontramo-nos outra vez para almoçar num restaurante onde por dois euros e cinquenta se serve bifana com batata frita – algo raro numa Lisboa gentrificada.
Hey! Pachuco
Entrevista por Cristiano Elias
Sobre a subvalorização da música local pelos portugueses
Yala: O que vem de fora tem sempre mais valor.
André: Especialmente em Portugal.
Yala: Tu vês isso aqui no Barreiro e em festivais, uma banda estrangeira recebe sempre um grande cachet, muita publicidade, mas para bandas pequenas...
André: Foi preciso haver uma pandemia para o Paredes fazer um dia dedicado só à música portuguesa.
Guilherme: É mesmo cultural, tu notas aqui – temos feito as nossas cenas e o público que temos construído não é daqui, é pessoal que vem do Seixal, Montijo —
Yala: E os nossos amigos músicos, e amigos desses amigos.
A audiência em Portugal não está aberta à música?
Guilherme: Acho que há o culto da pessoa: a malta vai ver o concerto pela pessoa que está em palco mais do que pela música. Gostam de todo o conceito do que é a banda e de cada personalidade dentro dela, mas isso não significa que gostem de ir ouvir música ao vivo.
Torna-se uma extensão de personalidade, ou talvez uma procura dela. A audiência que mais têm são outros músicos, não é?
Guilherme: Sim, pessoal dentro do meio.
Yala: Talvez umas cinco ou seis pessoas que vieram só para ver. Às vezes mais, às vezes menos, mas os músicos são a maior parte da audiência.
Guilherme: É normal! Acho que com música é que sempre serviu para juntar comunidades: ainda hoje há comunidades que se formam à volta de música. (…) Música é isso, é comunidade.
Sobre a mudança de atitude perante a arte.
Guilherme: Isso está cada vez mais a morrer. Por exemplo, nos anos 90/2000, com a antiga Hey!Pachuco, a malta saía à noite e ia a concertos.
Yala: Antigamente, tínhamos apenas a televisão e mais nada. Agora temos computadores, jogos, redes sociais.
Guilherme: À medida que a sociedade se foi tornando mais isolada, as artes foram afetadas.
Yala: Foram perdendo espaço, porque a arte era a distração.
Não sentem que as pessoas se fartam de dormir, de estar no telemóvel, e que eventualmente começam a fazer coisas, a procurar eventos?
André: Nós somos o exemplo disso.
Guilherme: Não acho que as coisas vão morrer, acho que... que... vai sempre haver pessoas estúpidas como nós a fazer coisas, que eventualmente atrairão outras pessoas.
Yala: O que falta nas associações é malta jovem a surgir para renovar a cena. Nós tivemos sorte de certa forma.
Guilherme: Havia o Programa Jovens Músicos e foi assim que entrámos para a associação.
Yala: No programa podias ir ensaiar uma vez por semana de graça.
Guilherme: Se não fosse assim, nem sequer estaríamos a tocar hoje.
Yala: Já não existe.
Guilherme: Um dos nossos objetivos era ressurgir esse programa para juntar malta mais jovem e chamá-los para este mundo. É muito caro um gajo do 10º ano pagar uma sala de ensaio.
Yala: Desde 2016 para cá, não surgiram bandas. Apenas três, duas das quais são nossas. Durante o COVID tivemos um programa, o Eco, que era para chamar gente e não veio ninguém.
Guilherme: O objetivo era ter dez projetos musicais, e foi difícil, tivemos de andar a convidar pessoas.
Por que é que foi tão difícil?
Guilherme: Acho que há um desinteresse porque tens muitas coisas para fazer e a arte fica em segundo plano, só mais tarde quando lidam com outras merdas é que começa a ganhar relevo.
Centralização Lisboeta
Lisboa é um ciclo vicioso – tem muito mais oferta e procura, logo chama mais artistas também.
Yala: O hype vem de Lisboa, mas o resto do país não conhece a malta.
Guilherme: Em termos musicais ou artísticos, só existes para as grandes plataformas se estiveres promovido em Lisboa.
Porquê? Por que não penetra no resto do país?
Guilherme: Porque é lá onde está toda a gente. Dinheiro. Tem tudo a ver com dinheiro. (…) Uma pessoa não vai ver um concerto em Famalicão se é de Lisboa. E é normal, os transportes em Portugal são muito maus. Queres ir para o Porto e demoras três ou quatro horas, mesmo que seja a 300 km de distância, enquanto na Europa Central demoraria apenas uma hora. Isso tudo contribui para a cena artística (…) ser muito desconexa. Tens a cena de Lisboa, a cena do Algarve e a cena do Norte. A cena do Norte é muito mais interessante porque lá estás sempre a 20 minutos de qualquer lugar.
Yala: É mais um contexto dos lisboetas terem a preocupação e quererem saber do que acontece fora daquele espaço.
André: Conseguimos atrair alguma malta, principalmente da música, e quando chegam ficam agradavelmente surpreendidos, do género "eia, isto é que é o Barreiro? Muito fixe.” É como a malta mais velha da associação dizia, é mais uma barreira mental.
O custo para o indivíduo também pesa – cada um de nós também poderia levantar-se meia hora mais cedo para correr e ser saudável, mas isso representa um custo individual que não queremos pagar; leia-se, a inconveniência de estar "longe" de casa.
Yala: Essa meia hora de levantar mais cedo é o que a gente faz desde sempre para ir a Lisboa.
André: Fazemos esse sacrifício com muito mais predisposição do que eles, sentimos. Temos a cultura de ir a concertos em Lisboa.
Yala: Sabes o que é mais engraçado? Nós demoramos menos tempo a ir para as faculdades do que muita malta em Lisboa.
O Guilherme dá-nos a conhecer o estúdio King, atual sede da Hey!Pachuco.
Guilherme: Há uma exposição de umas miúdas que conhecemos cá do Barreiro, com outros artistas convidados. Foram elas que organizaram a exposição. Temos um estúdio, uma sala de ensaios. Está tudo bem isolado. Aqui vês uma foto da malta antiga da Hey!Pachuco no primeiro Hey!Pachuco Fest, o estilo grunge mostra os primórdios da associação. Faziam concertos à toa e a malta também aparecia à toa. Agora estou a trabalhar mais na organização da Hey!Pachuco. A cena dos “Chamem os Amigos” foi o que me deu skills de organização, que tive de apanhar no meio do caminho. Basicamente nós queríamos saber como se faz um festival então decidimos fazer um todos os meses do ano.
Como fizeram isso?
Guilherme: Tínhamos um PA [Public Adress], tínhamos um espaço em que nos deixaram lá fazer a cena e tivemos o apoio da Sala 6 que nos deram máquina de imperial e estão reunidos os três elementos para fazer um festival. Chamámos bandas, amigos nossos, bandas de amigos. Depois evoluiu e começámos a chamar outras bandas. Foi só querer fazer. Foi bué merda fodida. Mas depois de fazeres um festival por mês, é tudo bué mais fácil. As costas ainda doem de carregar PAs. Se eu aprendi qualquer cena com o “Chamem os Amigos” foi que dá sempre para fazer, dá sempre para arranjar maneira, dá sempre para arranjar dinheiro. O que é preciso é saber e fazer. O Picos [fundador da Hey!Pachuco] já está nisto há bué tempo, e no Barreiro Rock, o festival que organizava, perdia dinheiro. Foi com a lição que ele aprendeu que nós aprendemos: só fazemos cenas se estivermos seguros das coisas. No “Chamem os Amigos” não estávamos a depender de nada, só de nós. É muito DIY. O Barreiro Rock no início foi muito fixe porque recebia dinheiros da câmara. Mas como isso está dependente do poder político, há anos em que tens e outros em que não tens – depende da sensibilidade/cunha da administração da câmara, que poderá ver investimento neste tipo de cultura enquanto fraco. Deixou de acontecer porque não havia dinheiro
Máquina, a banda convidada para o evento do dia, chega. “Traz o teu disco”, o evento mais recente dinamizado pela Hey!Pachuco, convida bandas a trazerem a coleção de discos que os inspirou a tornarem-se músicos. No final, a banda passa o seu último disco lançado.
Desconexão entre quem tem a pasta da cultura e quem faz cultura.
Guilherme: O pessoal com poder não percebe os problemas que temos, não percebe o que é arte. Para eles, é apenas mais um pacote para juntar o povo, educar as pessoas. Consigo contar pelos dedos as vezes que vi pessoal da câmara em concertos.
Não terão eles demasiado trabalho?
Guilherme: Mas o trabalho deles é a cultura — eles devem estar envolvidos na cultura. Como é que podes estar inserido na cultura se não participas nela? O que me deixa intrigado é que há pessoal com poder, até mesmo noutras associações, que não vai. Percebo que seja pessoal mais velho, mas pronto… Poderiam pagar alguém para ir assistir a concertos.
Isso seria bom.
Guilherme: Até tentaram culpar os privados dizendo que é falta de investimento dos mesmos, quando é precisamente o contrário. É estranho.
O André e a Marta chegam. Falamos um pouco sobre o King. Planeiam ter dois eventos mensais e jam sessions. Toda a promoção é feita através do Instagram e boca a boca.
Chamem os Amigos Fest
André: Nas últimas três edições, houve apoio da câmara. Sete edições sem apoio, e quando viram que resultava decidiram apoiar. Os Máquina vieram cá.
Pensam fazer mais edições?
Marta: Por agora não. Sem apoios não vale a pena. Porque ideias não faltam, falta o resto.
Guilherme: Nós temos trabalhos e isto é um investimento no futuro e feito a gosto, não há nenhum monetário para depois ter retorno.
Marta: É o que estava a dizer há bocado: se não estiveres nestas cenas por gosto, não estás. Dá demasiado trabalho e não ganhas nada.
Reflexões sobre a lei do mercado.
Ainda assim, têm notado uma evolução na Hey!Pachuco?
Afonso: Eu conhecia a Pachuco através do Barreiro Rock, depois acabou (…) e a associação morreu. Depois pegámos nisto e agora vive outra vez, mas ainda assim está muito longe de ser rentável.
Sem ser rentável estarão sempre dependentes de apoios.
Afonso: Sim, e da força de vontade. Agora com o PRR estão os próximos três anos garantidos de rendas mais ou menos.
Se os apoios se cortarem, as rendas continuam. É uma questão difícil encontrar esse equilíbrio e essa gestão de dinheiro. À partida não estará bem o Tony Carreira receber 50 mil euros e vocês nem 500 receberem, mas como é que se explica essa escolha? Inevitavelmente ninguém é obrigado a ter a mesma sensibilidade artística. Num exercício de ética utilitarista, o Tony Carreira poderá ter muito mais utilidade para o Barreiro do que projetos novos e pioneiros no presente - as pessoas podem sentir-se muito mais felizes a assistir a um concerto de Tony Carreira do que a um concerto de noise.
Afonso: Sim, se se organiza um programa de festas do Barreiro só com nomes da música alternativa, as pessoas ficam a olhar para aquilo e a pensar "Que merda é esta, já não vou votar no PS". Tem tudo a ver com isto, são muitas óticas.
Matilde: Em Lamego, quando começaram o ZigurFest no início também era assim, só depois é que a câmara percebeu que realmente, sendo uma cidade pequena do interior, tem muita malta da nossa idade que quer coisas novas. Portanto, aí é que eles começaram a apoiar.
Não ouvem com palavras, ouvem mais com ações. Efetivamente cada associação funciona enquanto organismo individual e é forçada pela lei do mercado a competir com as outras.
Afonso: Nem é propositado, é só as condições – consequência natural económica, estamos numa cidade com X número de pessoas… Podíamos estar mais bem organizados mas depois também há bifes e malta que implica uns com os outros… nós tentamos afastar-nos disso.
De onde vêm esses problemas?
Afonso: Não sei… Talvez cotas frustrados que nunca foram a um psicólogo. É toda uma geração. Tenho uma teoria que se a geração dos nossos pais e avós tivessem todos ido ao psicólogo o mundo era bué fixe.
O temido nove às cinco, ou como aprendi a não me preocupar com instabilidade financeira e amar a precariedade
Pensas muito no teu futuro e no da Hey!Pachuco?
Afonso: Bué.. especialmente agora que estou a acabar o curso.
Cursas o quê?
Afonso: Engenharia Mecânica na FCT e estou tipo… Isto é fixe mas isto não é fixe… Gosto de Engenharia, desperta-me curiosidade, mas… Não me enquadro nada na faculdade nem com as pessoas… Estagiei agora e ganhar dinheiro é fixe, mas estar todos os dias das nove às cinco a fazer uma merda nada interessante… Preferia viver com menos luxo e ter mais tempo livre… Não quero nada desperdiçar uma vida inteira a trabalhar.
Finalmente, entrevista a todos
Como se conheceram?
Yala: Na escola. A Marta e a Filipa já se conhecem desde o secundário
Filipa: Conhecemo-nos na manifestação da nossa escola.
Marta: O telhado caiu.
Yala: O telhado voou! E fizemos manifestação.
Filipa: O telhado voou até Lisboa. (Risos)
André: Duas semanas sem aulas.
Filipa: Aí conhecemos o Afonso, que conhecia o Gui e que conhecia o David.
Como é que descobriram esta vertente mais artística?
Filipa: Eu gostava de música e queria fazer alguma coisa relacionada com isso e sabia que havia um conjunto no Barreiro então procurei sobre o assunto. Eles ensaiavam na biblioteca do Barreiro. Falei com a Marta e ela também gostou e entrou. Depois o Guilherme — nós começámos a vozes e chorus nos Humana Taranja.
Juntaram-se por gostos em comum?
Yala: Sim, eu e o Guilherme tínhamos uma banda antes de nos juntarmos à Hey!Pachuco, éramos os Arroz com Feijão, o melhor nome de banda que alguma vez houve.
Entretanto entraram todos juntos para a associação?
Guilherme: Basicamente entrámos pelo programa jovens músicos. Tinha estado nos Arroz com Feijão aí, e depois comecei a fazer umas músicas, ele começou a fazer umas músicas e decidimos voltar com outras cenas. Acabámos por ficar com o meu projeto, Humana Taranja, e depois fomos convidando pessoas. O André entra mais tarde a vir ver concertos e com a banda dele com o Yala (Walter Walter) e com o Afonso. Foi basicamente isso, aos poucos fomos entrando para a associação que eram só velhos. E tivémos um espaço para fazermos o que quisermos.
Afonso: Entrámos numa fase em que a associação estava um bocado morta, o Picos estava com a vida dele e o trabalho dele, o resto da malta já tava casado com filhos então não havia grande predisposição…
André: Não havia um grupo a dinamizar a casa. Nós aparecemos na altura certa e começámos a dinamizar as coisas.
Houve algum outro factor externo, alguém a puxar-vos para isso, algum apoio da escola?
Guilherme: Nada, era só sala de ensaio.
Afonso: Era até melhor que a formação… a meu ver, dar espaço… há muita gente que não cria, e criar até pode ser muita coisa, criar música, construir móveis não sei… haver espaço para explorarem, espaço criativo.
Um espaço físico?
Afonso: Sim, um estúdio neste caso.
Yala: É diferente tocar em casa ou estar em aulas e a seguir umas certas regras do que estares com quatro a cinco pessoas num estúdio e estão ali a tocar.
Filipa: Sem serem obrigadas a nada.
André: Nós tínhamos uma liberdade bué grande só para estar a existir e a criar.
Afonso: E o picos tinha aquela cena que era zero julgamento, “desde que não me estraguem nada”.
André: Não havia bom e mau.
Afonso: A segunda vez que fomos ao estúdio abriu-nos a porta e disse “vá, vou a casa e já venho”.
O incentivo vinha só de vocês.
Afonso: Epah, e darem-te as ferramentas para explorares uma coisa que nem sabes que gostavas…
Quando digo Barreiro, o que vos vem à mente? E como acham que o Barreiro é visto pelo exterior, Seixal, Lisboa…?
Yala: Desconhecimento, especialmente a malta de Lisboa.
Afonso: Malta desta margem não tanto, acho que o rio é uma barreira enorme. “Ah gostava muito de ir mas fica longe” mas a viagem de barco de 20 minutos se calhar leva menos do que o tempo que gastam a ir de um lado ao outro de Lisboa de metro. É uma barreira psicológica. Aos poucos vamos trazendo malta cá e ficam sempre “ah afinal até é fixe”. Basta virem uma vez…
André: Exacto e as pré noções caem após.
Já trouxeram muitas pessoas ao Barreiro? Sentem haver um antes e depois de vocês entrarem para a Hey!Pachuco?
Yala: Conseguimos atrair muito tipo de gente diferente… antes de certa forma a Hey!Pachuco estava direcionada para um estilo musical mais específico, que hoje está um pouco ultrapassado, e atualmente trazemos todo o tipo de atos cá e malta mais jovem fica a conhecer o trabalho da Hey!Pachuco.
Marta: Ficam a perceber que há pessoal jovem a fazer coisas fora de Lisboa.
André: A Hey!Pachuco estava muito associada ao estilo garage, e nós com a nossa programação andamos a tentar fugir um bocado dessa caixa.
Yala: Tentámos manter um pouco do que já existia, mas trazer cenas novas também.
Têm critério de programação?
Yala, Marta: Coisas que nós gostamos
Filipa: Coisas emergentes também.
Yala: Sim, dar apoio.
Filipa: Por ser financeiramente mais fácil de trazer e também por dar espaço e palco a projetos novos.
Conseguem garantir cachet, tem sido um fator de peso?
Filipa: No “Chamem os Amigos” houve uma edição em que conseguimos um apoio da câmara então aí havia um cachet garantido. Sem ser isso é a porta. Mas é previamente falado.
Como surge a colaboração entre a Sala 6 e outros espaços?
Yala: Conhecendo as pessoas. A dona já conhecia o Picos e como nós somos a nova cara da Hey!Pachuco, há uma certa confiança.
Afonso: Quando há pessoas que têm vontade de fazer coisas, e vão conhecendo outras pessoas com vontade de fazer coisas, as coisas acontecem. Cada pessoa traz uma coisa diferente à mesa. Quando as pessoas se dão bem e são organizadas até se cria amizades.
Qual acham ser o cerne do sucesso local?
Afonso: O de trazermos bandas cá acho que tem que ver com a forma de recebermos as pessoas, que nem tem que ver com o dinheiro, mas arranjar sítio para ficarem a dormir caso for preciso Jantar, se não houver dinheiro para pagar fazemos nós qualquer coisa… Nós como banda tivemos a experiência de fazermos não sei quantos quilómetros para chegar a qualquer sítio e não há o mínimo de sensibilidade de acolhimento.
Marta: Ya, acho que isso não é a norma.
Afonso: Vais tocar a um bar e eles nem uma sandes te oferecem... Estas coisinhas pequeninas que as pessoas guardam.
Marta: Na sala 6 a ligação com as pessoas.
Afonso: Sim, tratar as pessoas bem.
Como arranjam fundos para sobreviver?
Guilherme: É muito jogo de cintura… o estúdio serve um pouco para pagar a renda… com as gravações e salas de ensaio. A gente não faz dinheiro disto… o objectivo é um dia fazer algum tipo de dinheiro disto, mas isto é uma sala de trabalho para o Picos e para mim… Agora vamos ter aqueles apoios do PRR, retomámos o programa jovens músicos, que vai ajudar a pagar a renda e dar funding a outros projectos… Temos o objetivo de estar daqui a três anos a renovar o programa para conseguirmos financiar os projectos e pagar uma ajuda a mim e à Marta e a todos para conseguir retribuir pelo trabalho.
Marta: Uma ajuda porque não tiramos salário mínimo daqui.
Ainda não receberam os fundos, como é que se têm mantido à tona?
André: É de poupanças.
Guilherme: Não [recebemos], está atrasado… O dinheiro vem de mim, do Picos, das bandas que ensaiam e gravações. É o que é… Esperar por dinheiro. É a vida do pessoal da cultura.
Sentem que já têm nome aqui? São bem recebidos pelos locais?
Filipa: Dentro do nosso pequeno nicho, sim.
André: Vai aparecendo malta nova também, é um processo gradual. As pessoas conhecem-nos primeiro e só depois a associação. Não é uma cena de marca, em que se conhece a associação e depois as pessoas, mas o contrário.
Qual é a vossa missão? Na Pachuco e individualmente
André: Drenar. (Risos)
Guilherme: Não sei se falo por todos mas acho que há um objectivo claro – sentimos que não somos representados a nível cultural aqui e por todo o lado. O objetivo principal é trazer o que a gente gosta e quer ouvir. Se não fôssemos nós os Máquina não viriam cá tocar. O segundo objetivo é ter a nossa vida artística e vida fixe, continuarmos todos juntos.
Marta: É importante continuar isto para o nosso bem estar geral, é uma coisa que fazemos porque gostamos, como quem gostamos [o oposto do mundo laboral] e mesmo que tenhamos outro trabalho que é uma merda, se continuarmos a fazer isto todos juntos - é uma cena fixe.
André: Sentirmo-nos realizados.
Guilherme: É um sentido de comunidade que é importante manter, não só connosco os cinco ou seis mas com o resto do pessoal que se vem juntando.
André: Trazer uma oferta cultural calibrada e diferente… Não ser sempre a mesma coisa. Desde bandas de rock, cantautor, free jazz, experimental… O que for.Afonso: E criar um espaço, um sítio, um circuito onde as pessoas possam encontrar cenas novas enquanto convivem.
Filipa, Yala, o que é para vocês a Hey!Pachuco?
(Pausa)
Yala: Amizade.
(Risos)
Bonito bonito